segunda-feira, 10 de julho de 2017

As comemorações dos 500 anos da atribuição do Foral Manuelino a Guimarães.

  

                                                        1 - Introdução


     A Sociedade Martins Sarmento está a comemorar os 500 anos do Foral que D. Manuel I concedeu a Guimarães, em 1517. Uma das iniciativas consistiu em proceder à reedição do Foral Manuelino, incluindo um fac-simile do documento original. O texto da anterior edição e agora a revisão é da autoria da Drª. Maria José Marinho de Queirós Meireles, onde faz um estudo codicológico do texto, guardado cerca de 400 anos nos Paços do Concelho e, desde 1922, na Sociedade Martins Sarmento, integrando o seu arquivo documental.
      A Sociedade Martins Sarmento, fundada em 1881, em homenagem ao arqueólogo e etnógrafo vimaranense, Francisco Martins Sarmento, é uma instituição cultural de utilidade pública, sem fins lucrativos. Os seus estudos científicos atrairam para Guimarães a atenção dos principais centros de cultura portugueses e estrangeiros do seu tempo. Abrange o Museu Arqueológico, a Citânia de Briteiros, o Museu de Cultura Castreja, a Biblioteca e a Galeria de Exposições.
 Os velhos forais, uns eram originários e outros confirmativos ou ampliativos. Assim, a mesma localidade, ao longo da sua história, (anterior à reforma de D. Manuel I) pode ter recebido mais que um foral, o primeiro dos quais (originário) é fundamental e o posterior ou posteriores vêm a seguir para confirmar, completar ou ampliar.
       Recorde-se que o 1º foral de Guimarães (e do Condado Portucalense) foi concedido em 1195/6 por D. Henrique e D. Teresa, sendo confirmado por D. Afonso Henriques, a 27 de abril de 1128. Neste foral, D. Afonso Henriques começa por agradecer aos vimaranenses o apoio que estes lhe deram aquando do cerco a Guimarães, posto em 1127, pelo seu primo, D. Afonso VII, rei de Leão e Castela, que exigia vassalagem. Note-se que pouco tempo depois, D. Afonso Henriques iria precisar de idêntico apoio popular, na Batalha de S. Mamede, travada a 24 de junho de 1128. O foral foi novamente confirmado por D. Afonso II, em 1217.  
    Porém, nos finais do sec. XV, o estado dos forais concedidos às populações, nos primeiros tempos da monarquia, encontravam-se totalmente desatualizados e grande parte deles falsificados, entrelinhados ou não autorizados. Quem o afirma são os procuradores dos concelhos (representantes do povo) nas Cortes, começadas em Coimbra em 1472 e terminadas em Évora em 1473, ainda no tempo de D. Afonso V. Essa queixa encontra-se assim formulada:

   “os forais de cada lugar, por onde se mais rege e governa vosso reino...são hoje em dia e assim todos ou a maior parte deles, falsificados, entrelihados, rotos, não autorizados e os tiram (os poderosos) do seu próprio entender, nem são interpretados a uso e costume d`ora, nem são conformes a alguns artigos e ordenações vossas...” E terminam pedindo ao rei que mande “examinar e extirpar as burlas e enganos dos forais e para isso os mande ir todos, sem exceção, à Corte”.
   
  Na sequência de tal pedido, foram reunidos na Corte os velhos forais, na sua quase totalidade escritos em latim, contendo referências a moedas em desuso ou que, com o decorrer dos tempos, tinham alterado de valor. Por vezes, mencionando pesos e medidas arcaicas, de tal modo que, sob o mesmo nome, ocultavam diferenças consideráveis entre si, da região para região ou até de concelho para concelho.
  Coube a D. Manuel I reconhecer e satisfazer a vontade dos queixosos, procedendo a uma profunda reforma dos velhos forais, ordenada em 1497. O primeiro foral reformado foi o de Lisboa, em 1500 e o último em 1520. Após a reforma e até ao sec. XIX só foram concedidos mais quatro forais, conhecidos pelo nome de forais novíssimos. Por decreto de 03.06.1822, os Constituintes reduziram ou extinguiram muistas das prestações foraleiras. A reforma de Mousinho da Silveira, em 13. 08.1832, extinguiu-os definitivamente.


                                         2 - Os forais como fonte de direito

   Postas estas considerações, analisemos agora os forais na perspetiva menos conhecida do público em geral, ou seja, sob o ponto de vista jurídico. 
  As cartas de privilégio são diplomas, outorgados pelos monarcas ou pelos senhores, concedendo um regime especial, de favor, a certa pessoa ou agrupamento de pessoas. De entre as cartas de privilégio estão as cartas de foral ou, simplesmente, forais, documentos que, aos habitantes de determinada terra, pré-existente ou a fundar, concediam certas regalias, principalmente de caráter fiscal e administrativo.
      Os forais foram importantes fontes de direito, na medida em que, para além de conceder a uma coletividade o domínio de um território que eles iriam povoar, cultivar e defender, definiam tambem os direitos e deveres coletivos dos seus habitantes, perante a entidade concedente do foral (rei ou senhor), bem como estatuir ou fixar o direito público local ou, pelo menos, certos aspetos desse direito.
       O normal conteúdo de um carta de foral são disposições relativas a impostos, aproveitamento de terrenos comuns, a composição e multas devidas pela prática de crimes, imunidades coletivas, deveres de serviço militar, encargos e privilégios de cavaleiros e peões, onus e forma das provas judiciais, conservação da paz, etc..
A. Herculano adota um conceito demasiado restritivo de foral, qualificando de forais apenas os diplomas que conferem existência jurídica a um município, indiciada que seja por qualquer magistratura própria ou privada. Não se verificando esta caraterística, segundo Herculano, estamos em presença de meras cartas de povoação ou contratos agrários coletivos (cf. H.P.- Tomo IV - 42, 45, 52). Praticamente todos os autores contrariam esta conceção de foral  por ser demasiado restritiva, invocando o facto de existirem concelhos que não têm foral ou só o receberam em fase adiantada da sua existência ou existirem forais que não têm subjacente organização municipal.
Na sua forma, os forais, ao longos dos tempos, tenderam a formar certos padrões ou tipos, ditados por condicionalismos geográficos ou económicos e até pelo desejo de o próprio poder central pretender introduzir certa uniformidade que se sobrepusesse ao particularismo consuetudinário. Assim, frequentemente, o monarca adota como modelo um anterior foral para conceder a outra povoação.
Importantes fontes de direito eram também as chamadas concórdias ou concordatas que constituiam a solução dada, mediante acordo, a desavenças geradas entre o rei e o clero, com vista à definição e reconhecimnto de recíprocos direitos e obrigações. Ainda hoje se praticam estas concordatas, como acontece atualmente com o Estado Português e o Estado do Vaticano.
   Excetuando os forais e as concordatas, os documentos escritos - régios ou particulares - (v.g. vendas, doações, permutas, testamentos e contratos agrários...), lavrados para atestar a prática de um ato jurídico não são fontes de direito, sobretudo na época em análise, mas são fontes da história, revelando como decorria a vida jurídica, quais os costumes praticados e as normas aplicadas, como funcionavam as instituições, além de provarem factos passados, as datas em que ocorreram e as pessoas que neles intervieram.
Eram elaborados por notários, na presença dos outorgantes, testemunhas e confirmantes.  Para a elaboração dos documentos régios existia a chancelaria do rei, mas as corporações monásticas tinham o seu “Scriptorium” que redigiam os documentos relativos a atos que beneficiavam, levando depois a robora (assinatura) régia.
         Por sua vez, os formulários, não sendo fonte de direito, tiveram também grande importância prática na vida do direito medieval, na medida que por eles se pautava a redação dos atos jurídicos que deviam respeitar certas solenidades para serem válidos ou eficazes. A fórmula era também uma fonte de história jurídica do maior valor porque, à semelhança dos documentos, nos mostra como decorria a vida jurídica e os costumes praticados.
                     
                     3 - Caraterísticas do direito nos primeiros anos da monarquia.

     Relativamente às caracteristicas do direito neste período, predomina o direito consuetudinário e foraleiro, ou seja, derivado dos costumes ou dos forais. O Estado da reconquista não dirige a sua atenção principal para as tarefas administrativas, nem para a produção do direito. É um Estado guerreiro e não, essencialmente, administrador ou legislador. Assim, a população dos reinos peninsulares, abalada pela invasão muçulmana e pelos próprios movimentos migratórios, que a reconquista provoca, ficou entregue a si mesma, num condicionalismo local, que, pela necessidade das coisas, tendia para a autosuficiência, começando então a viver o seu próprio direito, que não é criação do rei. É neste ambiente, de abalos sociais e desorganização causados pela invasão muçulmana e pela reconquista que se verificou um florescimento do direito consuetudinário, em detrimento da lei escrita.
    No que respeita às origens e elementos das formações consuetudinárias e foraleiras deste período é de salientar as experiências jurídicas romanas, germânicas, muçulmanas e francas. Além deste direito consuetudinário e foraleiro, formado ao longo dos tempos, há que referir o Código Visigótico que se manteve durante a Idade Média, na sua forma vulgata. No território português são abundantes as provas de aplicação deste Código, sendo muito frequente nos documentos da época encontrarem-se citações do Código, designado pelo nome de “lex gotorum”, “forum iudicum”, “liber iudicum” e “liber iudicialis”. Tais citações tem por finalidade mostrar a legalidade de determinado negócio jurídico: por exemplo, numa doação de 1110, referente a bens situados perto de Vila de Conde, figura entre os confirmantes “Petrus iudex (Pedro juiz) aba qui tenet lex Gothorum”. Também na doação feita aos franceses moradores em Guimarães de um campo situado junto ao paço real (palatium regale) fala-se também de “in Gotorum legibus” (Doc. Med. nº 55).    
     Encontram-se documentadas citações do Código Visigótico por todo o sec. XII. Todavia a partir do sec. XIII, começam elas a escassear por várias razões: no âmbito local, de há muito que a sua vigência era contrariada pela força do direito consuetudinário; no geral, a crescente atividade legislativa dos monarcas e o início da receção do direito romano acabaram por suplantar a “lex gothorum”. Os princípios do direito romano, direta ou indiretamente, em maior ou menor grau, informaram o nosso Código Civil de 1867, bem como os códigos em quase todos os paises da Europa.


    
       


              
    

terça-feira, 13 de junho de 2017

                         A igreja do batismo de D. Afonso Henriques.
                                                                                                                             
    
    Na Revista Medievalista nº 19, de janeiro de 2016, publicada pela Universidade Nova de Lisboa, o investigador Abel Estefânio defendeu que D. Afonso Henriques terá nascido no Reino de Leão e Castela, em Terras de Campos, talvez mesmo em Sahgún”. Porém, se os leitores estão recordados, na Secção Cultural do Diário do Minho, de 29.03 e 05.04.2017, penso ter demonstrado suficientemente que, ao contrário do que afirma Abel Estefânio, D. Afonso Henriques nasceu na Villa Vimaranes. Tal facto é comprovado por uma firme e arreigada tradição e confirmada, ainda que indiretamente, por documentos contemporâneos. Reconheço, no entanto, que a sua tese sobre a data de nascimento do Rei Fundador, calculada a partir de uma passagem da Vida de S. Teotónio, é mais credível do que a data obtida através do Crónica dos Godos.
  A passagem do texto da vida de S. Teotónio, traduzida do latim, diz o seguinte relativamente à sua morte:

        “Adormeceu na consciência de ter vivido bem e dos prémios dos
         méritos, no dia décimo segundo, antes das calendas de Março, a
         um sábado, primeira hora do dia, aquela em que Cristo ressuscitou.
         Foi sepultado no dia décimo primeiro das mesmas calendas, no ano 56
         do referido rei Dom Afonso I de Portugal, em cujo tempo recebeu a
         veste de Cristo, e no ano 35 do seu reinado. Viveu em votos de vida
         regular trinta e um anos. Cumpriu o tempo inteiro da sua vida, como
         ele referia, entre setenta e oitenta anos, segundo o padrão das escrituras”.

   Esta passagem contêm elementos que, relacionados com a data da morte de S. Teotónio, permite obter a data de nascimento de D. Afonso Henriques.  
   Assim, considerando que a morte de S. Teotónio ocorreu em 18.02.1162 e que, nessa altura, o nosso primeiro monarca tinha 56 anos de idade, então ter-se-á de concluir que D. Afonso Henriques nasceu em 1106 (1162-56=1106). E conforme refere o mesmo texto, na altura da morte de S. Teotónio, D. Afonso Henriques contaria 35 anos de governo, iniciados em 1128, com a vitória na Batalha de S. Mamede. 
   Saliente-se que S. Teotónio foi o primeiro prior do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra e conselheiro espiritual de D. Afonso Henriques, sendo que o texto sobre a sua vida é um autógrafo escrito cerca de 1162, no período entre morte de S. Teotónio e a sua canonização (1163). Esta proximidade da produção do texto da Vita Theotonii (1162) relativamente à data de nascimento de D. Afonso Henriques (1106) e a sua contemporaneidade com o período da sua vida (1106-1185), torna esta fonte mais credível que as outras, produzidas em tempos mais afastados, nomeadamente a Crónica dos Godos, escrita muito provavelmente pouco depois da morte de D. Afonso Henriques. A Crónica dos Godos tem contra si o facto de apresentar três referências contraditórias acerca da data do nascimento do nosso primeiro monarca, retirando-lhe credibilidade.

  Assente que D. Afonso Henriques nasceu em 1106, na Villa Vimaranes, analisemos agora o outro elemento essencial da sua identidade: a Igreja do seu batismo. 

   A tradição diz que o batismo do infante Afonso Henriques ocorreu na Capela de S. Miguel do Castelo, em Guimarães. Porém, são diferentes as opiniões dos eruditos,  investigadores e historiadores ao longo dos tempos.
Para apurar a sua veracidade, importa, antes de mais, mencionar as teorias sobre as suas origens.    
 No século XIX, havia quem datasse do sec. X a humilde capela, sendo que alguns afirmavam mesmo que ela já existia quando Mumadona fundou o seu mosteiro (vg Vilhena Barbosa (1811-1890) - cf. Monumentos de Portugal). O Arqueólogo Albano Ribeiro Belino (1863-1906) também defendia esta tese, baseando-se nas suas caraterísticas arquitetónicas. Dizia ele que “a arquitetura singela e tosca desta pequena igreja, a espessura das paredes, os modilhões largos e lisos e o próprio remate da porta, em desalinho com o da fachada, tudo nos asssegura que a sua construção data dos fins da época primordial romano-bisantina, sec. X” (cf. Arqueologia Cristã, pag. 43).
   Outros dizem que as suas origens remontam ao primeiro decénio do sec. XII, porquanto teria sido mandada construir por D. Henrique, pai de D. Afonso Henriques, depois da célebre viagem de paladino e peregrino à Terra Santa, ou seja, entre 1105 e 1110, facto que justifica a designação de “Capela Real”. Porém, nem D. Henrique fez tal viagem à Terra Santa, nem a construção da capela nessa altura tem verdadeira consistência histórica, pois nenhum elemento coevo o confirma.
Uma corrente de opinião mais moderna aponta as suas origens para as três décadas do século XIII.

 Diga-se que a opinião daqueles que fazem remontar a fundação da vestusta igreja ao sec. X não tem hoje qualquer fundamento credível, e duvido mesmo que haja algum autor da atualidade que a defenda. Nas duas restaurações da capela, de que se falará mais adiante, nenhum elemento arquitetónico foi encontrado que de algum modo pudesse legitimar a hipótese de ser anterior XII.
 Por sua vez, a tradição, também antiga, que atribui a D. Henrique a iniciativa da sua construção, para sua Capela Real, é rejeitada por vários investigadores mais modernos, os quais afirmam que pela sua datação, o românico já não é perfeito, e parece prenunciar, em alguns aspetos, a ascenção do gótico”, atribuindo a sua construção à Colegiada de Nª. Srª. da Oliveira (cf. Wikipédia - a enciclopédia livre).
Antes de apontarmos a origem mais provável para a construção da Capela, vejamos as duas restaurações a que me referi anteriormente. 
 Em 1870, o estado de ruina do edifício era tal que o arcebispo de Braga, D. José Joaquim de Azevedo e Moura, vendo-o impróprio para o culto religioso, foi obrigado a privá-lo de todas as antigas prerrogativas paroquiais e um pouco mais tarde o telhado abatia. Em 1874, uma comissão de vimaranenses, de que fez parte o Padre António José Pereira Caldas e J. Pinto de Queirós, e com a colaboração da Sociedade Martins Sarmento, diligenciou angariar fundos necessários para a restauração do monumento. Os donativos apareceram, sendo que o Estado contribuiu com 1.200$000 reis. Em 17 de Agosto de 1874 foram iniciadas as obras de restauração, que não prejudicaram a arquitetura antiga: uma capela humilde, de rude construção e de reduzidas dimensões. Essa restauração foi levada a cabo sob patrocínio da Asssociação dos Arquitetos e Arqueólogos Portugueses, mas só quase seis anos depois, em 20 de junlho de 1880, é que a Capela restaurada foi reaberta aos fiéis.
Por volta de 1940, a Direção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais ( DGEMN) procedeu a nova restauração, já que existiam danos provocados pelo tempo. Foram então realizadas as seguintes obras:
- Reconstrução do telhado, rebaixamento e lajeamento do pavimento da capela-mor, entaipamento da porta aberta na fachada sul da capela-mor, rebaixamento e pavimentação do chão exterior que circunda a capela, entaipamento de duas janelas rasgadas em anos ainda próximos, apeamento do campanário, demolição de dois pequenos altares, sem nenhum valor, colocação em adequado lugar da antiga pia batismal da capela devidamente resguardada por uma grade de ferro (cf. Boletim da D.G.E.M.N - nº 20 - junho de 1940).
     É provável que outras reparações, igualmente importantes, contribuissem, ao longo dos séculos, para a manutenção e conservação da sua primitiva traça.
       
Qual a opinião mais credível?

  A resposta será dada através de prova documental e de estudos de especialistas na matéria. Diga-se, desde já, que a opinião que se me afigura mais consistente parece ser a que remonta a construção da Capela às duas primeiras décadas do século XIII, pelas seguintes razões fundamentais:
1 - A arquitetura singela da capela, as suas reduzidas dimensões, a pobreza ornamental (interior e exterior), tornam, desde logo, quase impossível que D. Henrique mandasse construir um edifício com semelhante pobreza e ainda para mais para servir de “Capela Real”. Na verdade, além das lajes que constituem o pavimento da Capela e da pia batismal, creio nada mais existir que possa atrair a atenção do visitante esclarecido. O especialista no estudo do românico português, Manuel Monteiro (1879-1952), defende que, a Capela de S. Miguel, “não obstante a rudeza da sua fábrica, é nítida e tipicamente românica, pelo seu aparelho e pelo desenho das suas portas, cornijas e modilhões” (cf. Românico Português - Separata do fasc. 3-4, vol. LVlIII - Rev. Guim. 1948). E de acordo com os especialistas na matéria, o estilo românico português só se apresenta triunfante a partir dos meados do sec. XII, coincidindo com a reconquista do sul, especialmente com a afirmação da independência.
   2 - Dada a divergência de opiniões relativamente ao estilo da Capela (“tipicamente românico”ou “românico imperfeito com prenúncia de alguns aspetos da ascensão do gótico”), a procura do período da sua construção deve apoiar-se noutros elementos provatórios.
   3 - Sabemos que a Villa Vimaranes se desenvolveu a partir do Mosteiro em direção à Colina, formando-se aquilo que Manuel Monteiro designa como o “bairro alto ou casteleiro, de formação muito lenta e só tardiamente carecida de um refúgio espiritual cuja sagração solene apenas se efectuou em 1239, com a intervenção do Arcebispo D. Silvestre Godinho” (cf. op. cit.). Então o número de residentes na Colina passou a justificar a criação de uma nova freguesia que se veio a chamar freguesia de S. Miguel do Castelo, ficando sufragânea da freguesia de Santa Maria, da qual se tinha desmembrado. A esta conclusão nos leva as Inquirições de D. Afonso III, de 1258.
4 - A construção da capela teria sido mandada construir pela Colegiada, à revelia da autoridade episcopal bracarense, com vista à fundação da referida nova paróquia que servisse os habitantes do tal “bairro alto ou casteleiro”.
5 - São conhecidos os conflitos travados pelos priores e cónegos da Colegiada e o arcebispo D. Estevão Soares da Silva (1212-1228), porquanto a Colegiada só reconhecia a autoridade do Papa e não permitia a intromissão do arcebispo de Braga nos assuntos da igreja vimaranense. Porém, D. Estevão Soares, por ocasião da sua sagração, apresentou queixa ao Papa Inocência III contra a desobediência dos Priores de Guimarães.
6 - Esse conflito com o arcebispo D. Estevão Soares terminou em acordo (concordata, composição), celebrado em 23.10.1216, com o Cabido da Colegiada, e homologado pelo Papa Honório III, em 10.01.1217, através da Bula Sacrossanta Romana Eclesia. Esse acordo amigável, mediado pelos arcediagos de Samora e Astorga, estabeleceu, entre outras coisas, as seguIntes clâusulas, agora traduzidas e cujo conhecimento interessam ao presente estudo:

a)  O arcebispo de Braga teria e exerceria livre e absoluta jurisdição sobre o Prior e a Igreja vimaranense, como tem, de direito, sobre os Bispos ou Igrejas suas sufrgâneas.
 Esclareça-se que esta clâusula deu origem a divergentes intepretações, sendo que os Priores da Colegiada, invocando a referda clâusula, consideravam-se Prelados ordinários da sua Igreja, apenas reconhecendo o Arcebispo de Braga como seu Metropolita.
   b)  O Prior terá sobre os cónegos a jurisdição que têm os Bispos sobre os seus cónegos. No entanto, a jurisdição sobre os outros clérigos e leigos vimaranenses pertence ao Arcebispo.
   c)  O Prior pagará anualmente ao Arcebispo a procuração canónica pela visitação, devendo hospedá-lo no claustro ou na residência prioral.
   d)  As quatro Igrejas: de S. Paio, S. Miguel do Castelo, Santa Eulália de Fermentões e S. Miguel de Ceixomil são livres da prestação de censo e pertencem plenariamente ao Prior de Guimarães (“Item quator capellae, scilicet, Ecclésia Sancti Pellagii, Sancti Michaelis de Castello, Sante Eolaliae de Foramondaes, Sancti Michaelis de Creximir sint liberae a prestatione census, et respiciant plenarie Priori Vimaran.”- cf. Vimaranis Monumenta Histórica - Pag. 128).

  7 - A primeira referência documental que se conhece, relativamente à Capela de S. Miguel do Castelo, encontra-se precisamente nesta concordata, de 23.10.1216, entre D. Estevão Soares e o Capítulo da Colegiada (...Sancti Michaelis de Castello...)  
    Em 1220, a Capela de S. Miguel do Castelo ainda não tinha alcançado a categoria de igreja paroquial, uma vez que não é objeto das Inquirições desse ano (D. Afonso II). A capela surge, porém, nas inquirições de 1258 (D.Afonso III) como paroquial e sufragânea (dependente) da Colegiada (da Igreja de Santa Maria).
8 - De acordo com uma inscrição existente num caixilho de madeira, em 1239, reinando D. Sancho II, o arcebispo de Braga, D. Silvestre Godinho (1229-1244) procedeu à sagração da Capela, dedicando-a “in honorem beati Michaelis, et S. Martirum Saturnini, Juliani et Basiliae, Fausti et Januarii” (cf. Mons. J. Augusto Ferreira, in Fastos Episcopais da Igreja Primacial de Braga-tomo I - 20).
9 - Desde tempos imemoriais que a Igreja católica, relativamente às novas igrejas, costuma celebrar duas cerimónias. A primera ocorre com a benção no lançamento da primeira pedra. Depois, quando a construção da igreja chega ao fim, a celebração que marca a vida dela tem o nome de dedicação, também designada consagração, sagração ou inauguração. Nesta cerimónia, a igreja, ao ser dedicada, passa a ter um Titular como, por exemplo, um santo inscrito no Martirológico Romano. No presente caso, D. Silvestre Godinho decidiu-se, além de S. Miguel, por uma escolha de cinco mártires portucalenses: S. Saturnino, S. Julião, S. Basílio, S. Fausto e S. Januário.
   10 - Uma vez que, pelo menos desde 1216, a Capela de S. Miguel do Castelo já existia, a sagração, efetuada pelo arcebispo D. Silvestre Godinho, só podia ter por fundamento a criação da freguesia de S. Miguel do Castelo. Desde então passou a ser erigida como edifício destinado unicamente e de maneira permanente para nela se reunir o povo de Deus e aí celebrar os ofícios divinos. Não sendo a criação de freguesia, a sagração fica sem explicação.
  11 - Como muito bem refere Manuel Monteiro “se a chamada Capela Real tivesse sido obra do Conde D. Henrique não é crivel que permanecesse deprovida de consagração cerca de século e meio”. Acrescente-se a esta oportuna advertência de Manuel Monteiro que, do mesmo modo, também não se comprenderia que a sua existência estivesse tanto tempo ausente dos documentos da época.
  13 - Verifica-se, portanto, que os dados resultantes da documentação, analisados racionalmente, induzem a concluir que a Capela de S. Miguel foi mandada construir pela Colegiada de Guimaráes, à revelia da autoridade episcopal bracarense, durante as duas primeiras décadas do sec. XII (não ultrapassando 1216) e erigida como igreja paroquial, através da dedicação (sagração) efetuada pelo arcebispo de Braga, D. Silvestre Godinho, em 1239. A rudeza da sua construção não é de maneira alguma inconciliável com esta conclusão, pois rusticidade em arte não é sinónimo ou equivalente de antiguidade.
Assim, excluída a possibilidade da vetusta igreja ter sido mandada construir pelo Conde D. Henrique e também excluida a hipótese de aí ser o local do batismo do infante Afonso Henriques, vejamos agora a igreja onde tal cerimónio ocorreu.

 Antes, porém, importa averiguar quando foi criada a Colegiada de Guimarães.

 Como já referi noutro escrito, segundo o padre António Caldas (1843-1884) ”o mosteiro foi dúplice até ao ano de 1089, quando por determinações eclesiásticas, as freiras sairam, ficando depois habitado por frades e clérigos até ao governo do Conde D. Henrique, o qual em 1103, lhe dera nova forma, elevando-o a capela real, e nomeando-lhe priores, que com outros eclasiásticos, já em 1130, guardavm o instituto dos cónegos regulares, antes da reforma canónica de Santa Cruz” (cf. Guimarães: apontamentos para a sua história - 269). Porém, o referido autor não apresenta qualquer prova documental ou outra que fundamente a indicação do ano de 1103 para a conversão do Mosteiro em Colegiada.
  Prova-se, no entanto, por documento (cf. doação de D. Teresa de propriedades em Briteiros e Real a Fromarigo Guterres - cf. DR - nº 20) que, pelo menos, em 24 de julho 1110, a Colegiada já existia, porquanto, nesta data, aparece como notário do Conde D. Henrique, Pedro Bispo, cónego da Igreja de Guimarães (Petrus Episcopus Comitis notarius, Ecclesiae Vimaranensis, canonicus notuit). Aos abades e monges do Mosteiro sucederam os priores e cónegos da Colegiada.
  Por sua vez, um documento de doação, de 23 de dezembro de 1107, à Sé de Braga, existente no Liber Fidei (nº 633) apresenta como confirmante o Abade Eita de Guimarães (“Abbas Eita de Vimaranes conf.”). Ora, esta referência a um Abade significa que, nessa data (1107), a conversão efetiva do Mosteiro em Colegiada ainda não tinha ocorrido. Daí ser mais seguro afirmar que a conversão do Mosteiro em Colegiada, ocorreu entre 1107 e 1100. Sendo assim, o batismo de D. Afonso Henriques, em 1106, ocorreu na igreja do ainda Mosteiro que funcionava como Capela Real. Era a Ecclesia Vimaranensi” de que fala a Vida de S. Geraldo (cf. Vita Sancti Geraldi, in Portugaliae Monumenta Historica - Scriptores, vol. I - 53).
  Ora, tendo D. Afonso Henriques nascido em 1106, em Guimarães, e competindo a S. Geraldo proceder ao seu batismo, na qualidade de arcebispo de Braga, tal batismo só poderia ter ocorrido nesta“Ecclesia Vimaranensi” e não na capela de S. Miguel do Castelo, como erradamente refere a tradição, porquanto, como vimos, esta Capela ainda não existia. E foi certamente por esta razão que o Prior da Colegiada, D. Diogo Lobo da Silveira, em 12 de novembro de 1664, mandou transferir para a Igreja de Nossa Senhora da Oliveira a pia onde se diz ter sido batizado D. Afonso Henriques, colocando-a ali em um nicho defendido por grossas barras de ferro e com uma inscrição que atribuia ao arcebispo S. Geraldo o ato do batismo.
 Finalmente, há que referir que a Colegiada de Guimarães permaneceu ativa até à época liberal, altura em que foi extinta, por decreto de 1869. Por carta régia de 08.01.1891, foi novamente restaurada, tendo sido extinta pela 2ª vez em 1911. Porém, ressurgiu novamente em 1967 (cf. Conquistador, jornal da atual Colegiada - edição de 26.05.2017).
  
   Vejamos agora onde se localizava o palácio real e a Igreja do Mosteiro.

    Manuel Monteiro diz ser “fora de dúvida que os arquitetos de Cluni, ao serviço do Conde D. Henrique, reconstruiram sob os seus auspícios tanto a igreja como o edifício de Mumadorna, mas isolados e sem nenhuma ligação, destinando este para seu “palácio real”.
  A localização da Igreja do Mosteiro e do palácio real é-nos fornecida pela carta de doação feita pelos Condes aos franceses, irmãos Tibaldos, moradores em Guimarães, de um campo, situado junto ao palácio real, como recompensa de serviços prestados e destinava-se à construção de uma capela “para assistirem aos ofícios divinos em vida e obterem o eterno repouso, após a morte”. Em consequência da doação, os francos edificaram a capela de S. Tiago, à volta da qual havia de nascer a Praça de S. Tiago.
     O texto da doação identificativa é o seguinte:

 “...facimus kartam donationis et perpetua firmitudinis vobis Amberto Tibaldi et fratibus vestris Galtero Tibaldi et Ruiberto Tibaldi necnon etiam omnibus francigenis in villa de Vimaranes...campo quem habemus in villa de Vimaranis e jacet justa palacium nostrum regale, et ex alia parte sicut dividit cum clausis ecclesie sancte Marie, deinde sicut intestat cum atrio eijusdem ecclesie et vadit directu ad ruam de Francis et terminatur in eadem rua...”.(cf. DR-55).                               
                                  Tradução
  “ ...outorgamos carta de doação, firmada perpetuamente, a vós Amberto Tibaldi e vossos irmãos, Galtero Tibaldi e Ruiberto Tibaldi, bem como a todos os franceses, atualmente residentes em Guimarães, um campo que temos na Vila de Guimarães e que fica situado junto ao nosso palacio real, e, do outro lado, confronta com cerca da igreja de Santa Maria; depois, do mesmo modo, confrontando com o adro da mesma igreja, vai direto à rua dos Francos e termina na mesma rua...”
                             
   Daqui resulta inequivocamente que o palácio real ficava situado na vila vimaranense, junto da Igreja de Santa Maria e do terreno limitado pelos muros e adro desta igreja. A clareza deste texto contraria frontalmente Alberto Sampaio ao localizar o palácio real no local onde se encontra os Paços doa Duques de Bragança, bem como o Prof. Luis de Pina que o colocava no Castelo.
   Reforça esta ideia o facto de o objeto da doação ser um campo, o que desde logo invalida a localização acidentada na colina envolvente do castelo (Monte Latito), apontando para uma zona situada na parte baixa e plana. Por outro lado, o texto da doação é claro ao localizar o campo na villa Vimaranes.     
  Da Igreja de Santa Maria, reconstruida pelo Conde D. Henrique para servir de capela real, envolvida parcialmente por pórticos claustrais e independente do mosteiro, nada resta. No entanto, há quem lhe atribua “um capitel e uma aduela de arco figurados existentes no Museu Alberto Sampaio”. Todo o resto foi substituido no tempo de D. Joaõ I, sem alterar, contudo, na opinião de Manuel Monteiro, “nem a traça, nem a fisionomia da antiga habitação real, conservando, em grande parte, o facies do palácio condal. Tal fisionomia revela-se, ” na ala norte, na cornija alongada sobre corretos modilhões e na ala nascente, na porta da Sala do Capítulo que se recorta entre duas pequenas janelas geminadas”. (op. cit. pags. 10 e 11).
   De todo exposto resulta, com suficiente segurança, que só na Igreja de Santa Maria de Guimarães, adjacente ao palácio real, podia ter sido batizado D. Afonso Henriques, em 1106. A Igreja de Santa Maria, no sec. XIV, passou a chamar-se de Nossa Senhora da Oliveira. Daí que a pia batismal que se encontra na capela de S. Miguel do Castelo deveria ser colocada novamente na Igreja de Nossa Senhora da Oliveira, local donde nunca deveria ter saído.

                                                                                                                             Narciso Machado

         

sábado, 22 de abril de 2017

                                           Recordando Mário Soares


     Para todos os que partilham os valores do humanismo, da liberdade e da justiça social, a morte de Mário Soares foi um momento de profunda tristeza. No dia do seu funeral, o discurso das elites portuguesas foram quase unânimes no reconhecimento de um homem lutador contra a ditadura, pai da democracia e da liberdade. Mas, a democracia seria prejudicada se fosse silenciada a crítica sobre aquilo que correu menos bem durante o período da sua actividade política.  Alguns imputam-lhe a responsabilidade pelo modo como foi efetuada a descolonização, reconhecendo, no entanto, que o seu maior feito foi a nossa integração na União Europeia. 
      Para uma análise mais objetiva possível, e atendendo a que os jovens de hoje não fazem parte do período histórico em que esses factos ocorreram, vejamos, sumariamente, esse enquadramento histórico.
 Com a independência do Brasil, em setembro de 1822, as atenções dos portugueses viraram-se para África. Portugal que havia prestado toda a atenção ao Brasil, tinha deixado ao abandono as colónias de África, o que justificava agora um novo projeto para criar um verdadeiro império naquele continente. A permanência de Portugal em África haveria de perdurar até ao ressurgimento dos movimentos libertadores dos impérios coloniais. Na sequência do teor da Carta das Nações Unidas - que proclama que todos os povos têm direito à sua autodeterminação - os países colonizadores, no cumprimento de tal determinação, puseram em marcha movimentos de independência das colónias, arranjando, entretanto, meios de a substituir por formas de âmbito de cooperação económica e técnica, conseguindo, deste modo, obter os mesmos benefícios que tinham como colonizadores. Salazar, orgulhosamente só, continuou a defender, pelas armas, as colónias portuguesas. Em 1961, os movimentos de libertação de Angola, seguidos pouco depois por iguais movimentos de guerrilha na Guiné e em Moçambique, obrigaram Portugal a enviar para o terreno fortes contingentes militares. Os meios financeiros elevados nos gastos da guerra, o impacto psicológico provocado pelas baixas de milhares de mortos e mutilados, a contestação universitária, a emigração massiça dos jovens para fugir à guerra e uma guerrilha cada vez mais activa foram as causas determinantes para gerar a convicção em algumas chefias militares e na oposição ao regime, a ideia de que a paz não se obteria por meios militares, mas políticos, o que levou o denominado “Movimento das Forças Armadas” (MFA) a pôr fim ao regime do “Estado Novo”, em 25 de abril de 1974,fazendo nascer a  República e com ela a independência das colónias. Perante uma descolonização precipitada e sem uma negociação que permitisse uma saída calma, mais de meio milhão de pessoas, que habitavam as colónias, sem proteção e tomadas pelo pânico, abondonaram precipitadamente os territórios ultramarinos. Muitas delas, apenas com as roupas que vestiam, rumaram à metrópole onde acabaram por ser recebidas pelos seus familiares e amigos e com um mísero apoio do Estado, através do chamado Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais (IARN), criado em 31.03.75. Ao abandono ficavam os milhares de soldados negros que haviam lutado ao lado dos portugueses, tendo sido vítimas de miseráveis execuções sumárias em praças públicas.    Com o fim do império colonial, Portugal - que nos últimos anos da  República havia caminhado de costas voltadas para a Europa - oferecia-se agora um novo projeto nacional: a sua adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE), o que veio a acontecer através da assinatura do Tratado pela mão de Mário Soares, em 1 de junho de 1985, para entrar em vigor no dia 1 de janeiro de 1986. Há quem defenda que a má descolonização e o prejuizo e a dor causados aos mais de meio milhão de retornados se deveu à confusão e ao vazio de poder que se verificou nos princípios da revolução. Compete aos historiadores e investigadores averiguar, com serenidade, as verdadeiras causas desse lado negativo da história de Portugal. Mas, num balanço final, dir-se-á que os “pecados” cometidos por Mário Soares foram bem mais leves do que as importantes decisões que teve a enorme coragem de tomar

                                                                       Narciso Machado