terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

                                                            
                                       




           D. Afonso Henriques - local do seu nascimento
                   (Comentário à recensão de Abel Estefânio)



 Narciso Machado


     Na Revista Medievalista nº 19, de janeiro de 2016, publicada pela Universidade Nova de Lisboa, o investigador Abel Estefânio defende que D. Afonso Henriques terá nascido no Reino de Leão e Castela, em Terras de Campos, talvez mesmo em Sahagún”. Chega a esta conclusão a partir dos itinerários do conde D. Henrique e D. Teresa, obtidos através de documentos da coleção do mosteiro de Sahagún. Para o efeito, apresenta um quadro resumo desses itinerários, no período de julho de 1103 a julho de 1109. Refira-se que o douto investigador, num estudo publicado também na referida revista, defende que D. Afonso Henriques terá nascido em 1106, data obtida a partir de uma passagem do manuscrito Vita Theotonii” (Vida de S. Teotónio). Porém, se utilizarmos outra fonte - a Crónica dos Godos - onde se refere ter o infante Afonso Henriques dois ou três anos, quando seu pai faleceu (1112), obtemos o ano de 1109, mais concretamente os primeiros três meses desse ano. Afigura-se que o cálculo a partir da Vita Theotonii parece ser a fonte mais credível e assim o declarei no meu livro D. Afonso Henriques : Data e Local do seu Nascimento”.
Por sua vez, na mesma revista (nº 21, de janeiro de 2017), Abel Estefânio faz a recensão do meu referido livro, dizendo que apresento nove argumentos que, segundo ele, parecem não me convencer, uma vez que nesse estudo afirmo que na dúvida perante esses documentos, resta-nos continuar a acreditar na tradição”, ou seja, de que Afonso Henriques nasceu no palácio real de Guimarães. Acrescenta ainda que, perante a sua tese, no sentido de D. Afonso Henriques ter nascido no reino de Leão e Castela, não se surpreenderá “se eu não mudar de opinião, relativamente ao local de nascimento, como o fiz relativamente à data, “face à minha ligação afetiva entre a comunidade a que pertenço e o fundador da nacionalidade.”
    Verifico que não fui bem entendido nos argumentos que aduzi, já que não é por uma razão afetiva que defendo ter D. Afonso Henriques nascido em Guimarães, mas em virtude de existirem elementos bem mais convicentes do que aqueles que são invocados a respeito de outros locais propostos para o nascimento do Rei Fundador, nomeadamente Coimbra, Viseu e agora o reino de Leão e Castela. Afigura-se-me até, salvo o devido respeito por opinião diferente, pouco verosímil a hipótese do reino de Leão e Castela, pelas razões que, para além daquelas que apresento no meu referido livro, passo agora a expôr.

    Na defesa da sua tese, Abel Estefânio apresenta os “itinerários do conde D. Henrique e de D. Teresa” num quadro resumo, agora designado por QUADRO I.
                                            
                                                             QUADRO I

Quadro resumo do itinerário do conde D. Henrique e D. Teresa entre julho de 1103 e julho de 1109

Data
Qualidade do interveniente href="#_ftn84" [84]
Localidade de contexto href="#_ftn85" [85]
Reino onde foi outorgado href="#_ftn86" [86]
Fonte
Ano
Mês
Dia
D. Henrique
D. Teresa
1103
7
11
Beneficiário
Beneficiário
Guimarães
Condado Portucalense
Azevedo (1940), doc.125

10
-
Confirmante
Confirmante
Oviedo
Leão e Castela
Reilly (1988), p. 317

11
7
Confirmante
-
Palença
Leão e Castela
Reilly (1988), p. 317
1104
2
9
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1101

3
4
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1102

5
9
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1105

6
13
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1108

9
13
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1114
1105
1
30
Outorgante
Outorgante
Dueñas
Leão e Castela
Bishko (1971), p. 158

6
1
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1123


2
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1124

9
11
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1127


22
Confirmante
Confirmante
Burgos
Leão e Castela
Gambra (1988), doc. 184

12
13
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1128



Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1129
1106
1
10
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1132


12
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1133


16
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1134


22
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1135

2
19
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1137

3
4
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1139


15
Confirmante
Confirmante
Oviedo
Leão e Castela
Gambra (1988), doc. 185

6
10
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1145

7
28
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1146

8
1
Outorgante
Outorgante
Seia
[Leão e Castela]
Azevedo (1958), doc. 10


25
Outorgante
Outorgante
Lorvão
[Leão e Castela]
Azevedo (1958), doc. 11

11
7
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1149
1107
1
18
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1150

4
14
Outorgante
-
Astorga
Leão e Castela
Cavero (1999), doc. 534

5
8
Confirmante
Confirmante
Monzón
Leão e Castela
Gambra (1988), doc. 188


14
Confirmante
Confirmante
Burgos
Leão e Castela
Gambra (1988), doc. 18


6
12
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1153

7
27
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1154

8
7
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1156


27
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1157
1108
-
-
Outorgante
Outorgante
Tentúgal
[Leão e Castela]
Azevedo (1958), doc. 12

2
17
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1160

3
31
Confirmante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1162



Outorgante
Outorgante
Arouca
[Leão e Castela]
Azevedo (1958), doc. 13

9
4
Outorgante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1163
1109
5
22
Outorgante
-
Sahagún
Leão e Castela
Herrero (1988), doc. 1167

7
29
Outorgante
Outorgante
Viseu
Condado Portucalense
Rodrigues (1999), doc. 59



Outorgante
Outorgante
Coimbra
Condado Portucalense
Azevedo (1958), doc. 15



   Digamos, desde já, que as conclusões do douto investigador são rejeitadas pelos factos, pela historiografia e pela diplomática, sendo que o quadro de documentos que apresenta só poderá ser bem interpretado se comparado com um outro, abaixo designado  QUADRO II.

  Vejamos.


     Não se conhece a data em que D. Henrique veio para a Península, nem a data certa do seu casamento com a jovem D. Teresa, filha “iligítima” de Afonso VI. Sabemos, porém, com bastante plausibilidade que a partir dos últimos meses de 1095, D. Henrique, tendo já casado com D. Teresa, se subordinava a Afonso VI por virtude da concessão da Terra Portucalense. Num documento de 1098, diz-se já do Conde ser “totius provintie portuglensis dominus”, ou seja, “senhor de toda a província Portugalense” (P. M. H. - Dipl. et Chartae - 871). E em 1102, chama-se “Portugalense” (DMP- DP. III-80).
  Os historiadores debateram durante muitos anos a questão do título jurídico da atribuição do Condado Portucalense a D. Henrique e D. Teresa.
   Até ao sec. XIX, a maioria dos estudos defendia tratar-se de um dote que a infanta levou para o matrimónio. Alexandre Herculano dizia tratar-se de uma tenência amovível, revogável. Porém, a maioria dos autores discordam de Herculano. Assim, Paulo Merêa fala de uma doação de senhorio hereditário, com vínculo de vassalagem. Sánchez-Albornoz e o belga Charles Verlinden dizem tratar-se de uma tenência hereditaria, de caráter feudal (tenente de illo terra de Portugal pro sua hereditate).
 Qualquer posição que adotemos, de direito ou de facto, o certo é que a concessão da Terra Portucalense ao casal terá ocorrido, como se disse, por fins de 1095, passando para eles, a partir dessa altura, o governo do Condado, constituido como uma circunscrição política e administrativa, de limites variáveis. Assim, com tal concessão, o imperador Afonso VI transmitia ao casal os direitos régios (omnia regalia) em todo o território que o casal iria governar e mais a propriedade dos bens da coroa nele situados, embora sujeitos aos encargos de vassalagem, como era usual no reino de Leão. Segundo as regras da altura, a administração do território cabia ao marido, embora a propriedade continuasse a pertencer a D. Teresa.
    Logo a seguir à investidura vemos D. Henrique e D. Teresa, com assinalável autonomia, dentro da Terra Portucalense, a conceder forais, dar cartas de couto, fazer doações, confirmar atos, outorgar préstamos”, etc. São numerosos os exemplos que se podem colher nos D.M.P. Régios (ver quadro II).
A questão que desde logo se coloca, é saber para onde foi residir o casal, após a concessão do Condado: foram residir para o palácio real de Guimarães (palatium regale) ou permaneceram no Reino de Leão e Castela, como sugere Abel Estefâno?
   Seguindo um raciocínio lógico, o casal veio residir para Guimarães, que sempre foi a residência condal, desde o sec. X, ou seja, desde Mumadona Dias e seu marido, Mendo ou Hermenegildo Gonçalves. E foi a partir de Guimarães que D. Henrique e D. Teresa começaram a governar o Condado, iniciando-se aí o designado 2º Condado. Não é verosímil, nem lógico, admitir-se que o casal passou a governar o Condado a partir de Leão e Castela.
  
E como se chega a essa conclusão?

  Antes de mais, importa averiguar se Guimarãoes tinha condições ideais, relativamente a outros locais, para servir de sede ao novo governo do Condado.
  A Villa Vimaranes era um importante centro, que se formou desde a sua fundação com a condessa Mumadona, a dama mais rica e poderosa do noroeste peninsular. Tudo começou, cerca de 950, com a fundação do Mosteiro dúplice (frades e freiras) e do castelo roqueiro para garantir a sua defesa das investidas de normandos e muçulmanos. Essa torre, chamada de S. Mamede, tornou-se de menagem quando D. Henrique a fortificou com muralhas e torres, assim se formando o castelo. O Mosteiro foi dotado de grandes propriedades que se estendiam da Galiza a Coimbra e com dotações de Ramiro II, rei de Leão e sobrinho de Mumadona. Esse Mosteiro, além de grandes terras, possuia uma notável e valiosa biblioteca, constituida por vários códices.
  O mosteiro do Salvador e Santa Maria de Guimarães, assim se chamava, converteu-se num dos únicos senhorios monásticos portucalenses, anteriores ao sec. XI e depois, com a conversão em Colegiada, tornou-se num importante centro político e religioso. No plano eclesiástico, segundo o cónego dr. Avelino Jesus Costa, eminente historiador medievalista, no âmbito dos estudos de cronologia, diplomática, paleografia e história da Igreja, analisando o Censual de Braga do sec. XI, demonstrou “haver, nesta época, entre o rio Lima e o Ave e deste até Vizela, uma rede de cerca de 650 paróquias” (cf. Bispo D. Pedro e a Organização Paroquial da Diocesse de Braga).      
   Também importante, a favor da sede do Condado em Guimarães, é o facto de, em 1100, D. Henriques, juntamente com o bispo de Braga, S. Geraldo, terem conseguido junto do Papa a dignidade de metropole para a Sé de Braga, ficando como suas sufragâneas, a partir de 1103, as dioceses galegas de Astorga, Tui, Mondonhedo e Orense e, no Condado, as dioceses do Porto, Coimbra, Viseu e Lamego (cf. Carl Herdmann - O Papado e Portugal no Primeiro Século da História Portuguesa).
   Assim, se o mosteiro de Sahagún foi importante durante a Idade Média, com uma rica biblioteca e um scriptorium, onde se iluminavam e copiavam manuscritos, a Villa Vimaranes possuia idênticas condições para ser sede do novo governo, pois, para além de ser centro económico, social e religioso, era favorecida ainda pela sua posição geográfica, situada numa encruzilhada viária de grande importância, garantindo a centralidade e segurança necessárias ao governo do Condado. Sabe-se que alguns franceses que acompanharam D. Henrique estabeleceram-se na Villa Vimaranes e aqui construiram a capela de S. Tiago em terreno doado pelo mesmo Conde e situado junto ao palácio real (palatium regale), com rua de seu nome: “ruam Francis” (DMP - 55). Dos franceses que vieram habitar Guimarães há também registo nas inquirições de 1220 e 1258.

  Relativamentem à conversão do mosteiro na famosa Colegiada de Guimarães, o erudito e investigdor, padre António Caldas (1843-1884), diz-nos o seguinte :”o mosteiro foi dúplice até ao ano de 1089, quando por determinações eclesiásticas, as freiras sairam, ficando depois habitado por frades e clérigos até ao governo do Conde D. Henrique, o qual em 1103, lhe dera nova forma, elevando-o a capela real, e nomeando-lhe priores, que com outros eclasiásticos, já em 1130, guardavm o instituto dos cónegos regulares, antes da reforma canónica de Santa Cruz” (cf. Guimarães: apontamentos para a sua história - 269). E foi na referida capela real (“Ecclesia Vimaranensi” de que fala a Vida de S. Geraldo), que, durante a missa, celebrada por S. Geraldo, ocorreu o episódio da expulsão do soldado (militem) Egas Pais (Egeas Pelagii vocabatur), “na presença de D. Henrique e sua esposa, a formosa Rainha Teresa, e com eles uma multidão de próceres”. A expulsão de Egas Pais, segundo a Vita Sancti Geraldi, deveu-se ao facto de apesar de excomungado por incesto (coabitação irregular), continuar a assistir aos oficios divinos”.
   Esclareça-se que a Vita Sancti Geraldi é da autoria de um seu valido e discípulo, D. Bernardo, arcediago bracarense e, depois, bispo de Coimbra (cf. Vita Sancti Geraldi - PMH - Scriptores, vol. I - 53). Este episódio, narrado por um seu contemporâneo, deve merecer, por isso mesmo, a devida credibilidade.
 Os biógrafos de S. Geraldo dizem que ele “era visita assídua do paço dos Condes portucalenses. Amigo e conterâneo de D. Henrique, ambos estavam ligados à Ordem de Cluny, uma vez que D. Henrique era sobrinho de D. Hugo, abade de Cluny e amigo de Geraldo”. D. Henrique, por sua determinação, foi sepultado em Braga.   
    Perante este circunstancionalismo e na qualidade de arcebispo de Braga, competia a S. Geraldo proceder ao batismo de D. Afonso Henriques na referida Igreja (capela real), em 1106, e não na atual capela de S. Miguel do Castelo, como uma certa tradição vem afirmando. Razões de estrutura e estilo (românico imperfeito ou tardio, prenunciando em alguns aspetos ascensão do gótico) levam alguns estudiosos a colocar a sua construção em anos posteriores, no sec. XIII.

                             O itinerário a partir dos documentos lavrados no Condado

    A análise dos Documentos Medievais Portugueses, régios e particulares (DMP - DR e DP) levam-nos a uma conclusão diferente daquela que foi obtida por Abel Estefânio a partir dos documentos do QUADRO I.
  Registe-se, desde já, o facto de o primeiro ato oficial que o casal tomou foi conceder o foral a Guimarães, em 1095/1096 (doc. nº 1 do Quadro II), onde é patente, além de outras preocupações, um esforço para atrair povoadores. Em contraste com essa preocupação inicial, está o facto de o foral concedido a Viseu, ser outorgado 28 anos mais tarde, apenas em maio de 1123 e a Coimbra, em maio de 1111 (cf. DMP - nº 66 e 25). Será que alguém acredita que, se D. Teresa residisse em Viseu, por exemplo, em 1109, como defende Almeida Fernandes, apenas em 1123 lhe concedesse foral ? Na altura da concessão do foral, é muito provável que D. Henrique e D. Teresa tivessem já a sua corte em Guimarães.
   A seguir ao foral (1095/1096), seguiram-se outros atos, também de relevo para a vida política e social do Condado, como se verifica do seguinte quadro, designado como
                                    
                                                               QUADRO II

               Lista dos documentos do Conde D. Henrique e de D. Teresa,
                  entre 1095 e 1112 - cf. D.M.P - Rui  Pinto  de  Azevedo                                      
                                          (Documentos régios)

1 - (1095-1096) – Foral de Guimarães.
2  - (1095-1107) – Pacto entre os condes D. Raimundo e D. Henrique, jurado nas mãos de     
      Dalmácio, enviado da abade de Cluny.
3 - 1096 - Foral outorgado a Constantim de Panoias (c. de Vila Real).
4º - 1097, Novembro, 23 – Doação e coutamento a Soeiro Mende111111s de vários bens  
       compreendidos numa extensa área ao sul do Ave (c. Sto Tirso).
5 - 1097, Dezembro, 9  - O conde D. Henrique confirma à Igreja de Santiago de Compostela a doação de Correlhã com metade de Monte Maior ( c. Ponte de Lima).
6 - 1100, Março, Coimbra – Doação da igreja de S. Pedro de Rates (c. Povoa de Varzim ) ao mosteiro de S.ta Maria da Caridade da Ordem de Cluny.
7 - 1101, Março, 21 – O Conde D Henrique concede ao mosteiro de Sahagún tudo quanto possui em Villameriel, na comarca de Saldanha, prov. de Palência, em troca do mosteiro de S. Pedro de Tronco.
8  -1101, Junho, 8 - Doação do mosteiro de Sto António de Barbudo (c. Vila Verde) e de certas propriedades em  Palmeira (c. Braga) e Pitães (c. Amares) á Sé de Braga.
9 - 1106, Fevereiro, 1, Guimarães – D. Teresa faz doação da Idanha e de seu dilatado termo a D. Egas Gosendes e D. Mourão Gosendes, com sua mulheres, por suas vidas, devendo depois da morte destes donatários passar para a Ordem do Hospital.  
10 - 1106, Agosto, 1 - Doação vitalícia aos presbíteros João Siiciz e Fáfila da herdade de S. Romão (c. Seia) com obrigação de a povoarem e cultivarem.
11  - 1106, Agosto, 25 - Doação de metade da villa de Cacia (c. Aveiro) ao mosteiro de Lorvão.
12 - 1108 - Carta em que se outorgaram aos povoadores de Tentúgal (c. Montemor –o Velho) os mesmos foros que têm os moradores de Coimbra.
13 - 1108, Março, 31 - Carta de couto outorgada ao mosteiro de S. Martinho de Espiunca (c. de Arouca), sob o regime do bispo de Coimbra.
14 -  1109-1112) – Carta de foral concedida a Azurara (c. de Mangualde).
15  - 1109, Julho, 29 – Doação do mosteiro de Lorvão à Sé de Coimbra.
16  -(1109, Dezembro, 10)? – Carta a favor da Sé de Braga delimitando o respectivo couto.
17- - (1110-1111) – Carta de foral outorgada pelo Conde D.Henrique aos povoadores de Oca (prov. Burgos, Espanha)
18  - 1110, Março, 25 - Carta de couto do mosteiro de Tibães (c. Braga).
19  - 1110, Março, 26  – Carta de couto do mosteiro de Tibães (c. Braga).
20  - 1110, Julho, 21  - O Conde D. Henrique confirma à Sé de Viseu o couto que Fernando Magno lhe concedera dentro da cerca velha da cidade.
21 -  1110, Julho, 24 – D. Teresa com autorização do marido, o Conde D. Henrique, faz doação de propriedades em Briteiros (c. de Guimarães) e Real (c. de Esposende) a Fromarigo Guterres.
22  - 1110, Agosto – Carta de doação e couto, a favor de Bernardo Franco, de cinco casais em Villa Boa (c. de Satão).
23  - 1110? Outubro, 29 – D. Teresa confirma à Sé de Braga o couto que lhe dera Afonso V de Leão, concedendo à mesma os respectivos direitos fiscais.          
24   -1110? Novembro, 9 – D. Teresa faz doação de Torneiros (c. de Braga) à Sé de Braga.      
25 -  1111, Maio, 9  - Carta de foral outorgada aos moradores de Satão.
26  - 1111, Maio, 26 –Foral concedido aos habitantes de Coimbra.
27 -  1111, Junho – Foral outorgado aos habitantes de Soure.
28 - (1112) Fevereiro, 27 – Foral concedido aos povoadores de Tavares (c. Mangualde).
29  - 1112, Março, 1 – Doação ao conde Froila e sua mulher, a condessa Estefânia, de um solar (chão) em Astorga e dos bens de raiz que pertenceram ao judeu Zaide.
30  - 1112, Março, 27 – A rainha D. Urraca com seu filho D. Afonso e D. Henrique com sua mulher D. Teresa confirmam à Sé de Oviedo as doações e privilégios dos reis anteriores, e doam-lhe a cidade de Oviedo, além de várias propriedades e mosteiros
31 - 1112, Abril, 12 – Carta de couto da Sé de Braga, com expressa concessão dos direitos que se pagavam ao fisco real dentro do termo demarcado.
32 -  (1112, Maio – 1126, Março) – A rainha D. Urraca jura amizade fiel a sua irmã D. Teresa e concede-lhe vários lugares e terras, obrigando-se a infanta, por sua parte, a defender tanto esta “hora” como a que possui.
33 -  (1112, Maio,10)? – D. Teresa vende a Froila Spaci a parte que lhe pertence na igreja de Santa Leocádia (c. Baião).
34º -  1112, Maio, 15 – Doação a Mendo Gonçalves e sua mulher Maior Soares de certos bens na villa de Kastro (Crasto, C. Villa Nova de Gaia).
35  -1112, Maio,22 - D. Teresa doa a Gonçalo Gonçalves os quinhões que lhe pertencem no mosteiro de S. Salvador de Vilar e na vlla do mesmo nome (Vilar de Andorinho, c. de Vila Nova de Gaia).
36  - 1112, Agosto, 1 - Carta de couto do mosteiro do Pombeiro (c. Felgueiras).
37  - 1112, Novembro, 6 – Doação a Soeiro Mendes de três casais em Lanhas (c. de Vila Verde)   

     Documentos de D. Henrique (1095-1112), conhecidos por referência     
    de outros documentos (cf. DMP - DR - Rui de Azevedo).

1 - Foral outorgado pelo conde D. Henrique aos habitantes de S. Martinho de Alva (c. Castro Daire) - inquirições de D. Afonso III (1258)- PMH - Inquis. I - pag. 930.
2 - Doação e coutamento do mosteiro de S. Pedro das Águias (c. de Tabuaço) por D. Henrique (inquirições de D. Afonso III (1258) - PMH- Inquis. I - pag. 1095.  
3 - D. Henrique e D. Teresa coutaram S. Miguel de Entre os Rios (c. Penafiel) a Mem Moniz e sua mulher (Memórias do mosteiro de Paços de Sousa - doc. 18
4 - Doação de S. Cosme de Garfe (c. de Póvoa de Lanhoso) pelo conde D. Henrique, com o encargo de foro em géneros - Inquirições de D. Afonso III (1258) - PMH - Inquis. I - pag. 714
5 - D. Henrique coutou Leomil (c. de Moimenta da Beira) a D. Garcia Rodrigues - Inquis. de D. Dinis (1288).
                                                   Documento particular

 125 - 11, Julho 1103 - Mendo Viegas, Gomes Nunes e Toda Eitat dão ao conde D. Henrique e sua mulher, D. Teresa, e ao mosteiro de Guimarães bens que possuem  em Pousada (c. Guimarães), em troca de um quinhão no mosteiro de Pombeiro (cf. Docs. Particulares, vol. III-Academia Portuguesa da História-Rui Pinto de Azevedo).
        
 Nota explicativa: 
   1 - O espólio diplomático henriquino até ao seu falecimento, (fins de abril de 1112), é de 31 documentos, mais 5 por referência. O espólio diplomático de D. Teresa, posterior à morte do marido, é de 52 diplomas, sendo o último, de 31 de março de 1128, portanto, cerca de dois meses e meio antes da Batalha de S. Mamede (24.06 de 1128). Deste número, 22 procedem da sua chancelaria e 17 lavrados por escriba particular. Dos restantes, 5 são falsos e 8 são desprovidos de notário.          
  2 - Os docs. nº 7 (doação ao mosteiro de Sahagún), 28 (doação em Astorga) e 29 (doações à Sé de de Oviedo) dizem respeito a terras, situadas fora do Condado.  
  3- Os documentos 9 e 18 são considerados falsos (cf. Diplomática do conde D. Henrique (1095-1128) e de D. Teresa (1112-1128) - Rui Pinto de Azevedo).

                                  Análise comparativa dos dois quadros

Comparando-se agora os dois quadros, verifica-se que, no quadro apresentado por Abel Estefânio (de 1103 a 1109), D. Herique e D. Teresa outorgam 7 documentos: 1 em 1105, dois em 1106, dois em 1108. Todos estes documentos, segundo Abel Estefãnio, foram outorgados em Leão e Castela, colocando no Condado Portucalense apenas os outorgados em 1109 (Viseu e Coimbra). Ora, tal registo contraria a informação constante do Quadro II (DMP - DR), onde se verifica que todos esses documentos (10, 11, 12, 13, 15, 59) foram outorgados no Condado Portucalense, exceto o outorgado em 1105, respeitante à doação ao mosteiro de Santo Isidoro de las Dueñas, de 30 de janeiro de 1105. 

   Vejamos.

O ilustre investigador coloca os documentos 10 (Seia) e 11 (Lorvão), do Quadro II, a ser outorgados no Reino de Leão e Castela, com a seguinte justificação:
  “Em 10 de junho e em 28 de julho de 1106, (D. Henrique) volta a confirmar documentos particulares de Sahagún, sendo o último destes um original que nos merece toda a confiança, torna impossível que o conde D. Henrique se tenha deslocado a Seia, a 1 de Agosto, para doação da herdade de S. Romão aos presbíteros João e Fáfila. Pelo que também não me parece credível que no dia 25 do mesmo mês se tenha deslocado ao Condado Portucalense para a doação de Cacia ao mosteiro de Lorvão”.
  Afigura-se-me que tal conclusão é inverosímil. Com efeito, quem designava as datas para as escrituras, como é evidente, eram os respetivos outorgantes (D. Henrique e D. Teresa), pelo que, em princípio, não iam marcar as escrituras dos docs. 10 e 11 do Quadro II para a data em que D. Henrique teria de confirmar outro diploma fors do Condado, se não estivesse em condições de a ela comparecer. Não é bom principio de interpretação colocar uma mera confirmação e um documento particular no mesmo patamar e com o mesmo rigor de dois documento régios. Se efetivamente existe incompatibilidade de datas entre a invocada confirmação e as outorgas referidas nos documentos 10 e 11, essa incompatibilidade deve ser encontrada no lado da confirmação, de tal modo que no confronto entre documento particular e diploma régio deve prevalecer a interpretação a favor deste, por se presumir de maior rigor.    
   Abel Estefânio não apresenta uma justificação plausível para mudar a outorga dos textos dos documentos 10, 11, 12 e 13 do Quadro II, do Condado, para Leão e Castela, contariando a opinão unânime dos investigadores, nomeadamente o diplomatista Rui de Azevedo.
    De todo o modo, sempre se dirá que o espaço de três dias, entre a data da confirmação, (28 de julho), e a outorga do doc. 10, (1 de Agosto), seria suficiente para uma viagem de Guimarães até Sahagún. Por outro lado, importa ter em conta que as chancelarias não eram organizações fixas, mas, sempre que fosse necessário, os notários deslocavam-se para facilitar a recolha das roboras, justificando os casos em que as datas são demasiado próximas.

E que dizer da doação ao mosteiro de Santo Isidoro de las Dueñas, celebrada em 30 de janeiro de 1105?  

Segundo Abel Estefânio, a este ato compareceu “um elevado número de 43 confirmantes, para além de proceres portugueses, um conde, três tenentes de terra, três bispos, três abades e três priores, todos eles leoneses, para concluir pela capacidade mobilizadora que o conde possuia em Terra de Campos”.
Porém, a esta informação de Abel Estefânio importa acrescentar três factos omitidos e muito importantes, todos favoraveis a Guimarães:
     1º - Trata-se de uma importante doação de uma quantidade de herdades, situadas no Condado Portucalense e doadas ao mosteiro de Sto Isidoro de las Dueñas, pertencente à ordem de Cluny.
     2º - Nesse documento, encontram-se intervenções de 43 personalidades. Porém, dessas personalidades, mais de metade (26) pertencem ao Condado Portucalense.     
     3º - Essas personagens eram funcionários da residência condal de Guimarães (vg. o alferes Soeiro Nunes e o mordomo Pedro Pais), magnates do território bracarense (vg., Diogo, Egas, Nuno, Mendo, Gueterres) e Egas Moniz, provavelmente, segundo alguns autores, o de Riba Douro, futuro aio do infante Afonso Henriques.
     Este grande apoio de portucalenses, levados do Condado por Henrique e Teresa, aponta também para a residência condal em Guimarães. E a doação deve ser interpretada como tendo a finalidade de obter o apoio de Cluny no fortalecimento do poder dos Condes no território Portucalense. (cf. Marsilio Cassotti-D.Teresa: 1ª Rainha de Portugal-94).
   As restantes seis outorgas, registadas no Quadro I, correspondem aos documentos nº 10 (Seia), 11 (Lorvão), 12 (Tentúgal), 13 (Arouca), 15 (Coimbra)  do Quadro II. Na determinação do local onde esses documentos foram outorgados é importante saber quem eram os respetivos notários ou escribas.
Os documentos 12 (Tentúgal) e 15 (Coimbra) foram lavrados pelo presbítero Pedro da Sé de Coimbra; o documento 10 foi lavrado por Ennegus; o doc. 13 foi lavrado pelo notário Didagus presbiter et monacus”. Os confirmantes e testemunhas são personalidades do Condado. Saliente-se que nenhum destes notários pertence à chancelaria de D. Henrique, porquanto, durante o governo do Conde D. Henrique (1095-1112) o notário da cúria era o cónego da igreja vimaranense, Pedro Moniz, que assina com o nome de Pedro Bispo.
 Como adiante melhor será esclarecido, “vários diplomas de D. Henrique não foram redigidos e lavrados pelo pessoal adstrito à cúria condal, mas por notários e escribas a ela estranhos, afiliados a catedrais e mosteiros” (cf. Rui Pinto Azevedo - Diplomática do Conde D. Henrique e D. Teresa).

      Feito este saneamento no QUADRO I, vejamos o que resta ?

Relativamente a D. Teresa, resta apenas uma outorga num documento lavrado no Reino de Leão e Castela, ou seja, a doação ao mosteiro de Santo Isidoro de las Dueñas, de 30 de janeiro de 1105. Porém, como vimos, até este documento reverte a favor de Guimarães. Os restantes seis documentos, outorgados por D. Tersa, todos eles foram outorgados no Condado Portucalense. Quanto a confirmações de D. Teresa, o QUADRO I regista apenas 5 (cinco), com datas muito largas (outubro de 1103, 22 de setembro de 1105 e 15 de março 1106) ou datas muito apertadas (8 e 14 de maio de 1107), o que permitia a sua deslocação a partir de Guimarães.
Assim, no período entre julho de 1103 e julho de 1109, o itinerário de D.Teresa, em Terras do Reio de Leão e Castela, obtido através dos documentos do QUADRO I, resúme-se a uma outorga e cinco confirmações. Ora, para a determinação do local de nascimento de D. Afonso Henriques, como é evidente, o que conta é o itinerário de D. Teresa que afinal se revela demasiado magro no Quadro I,

             Como interpretar as 32 confirmações de D. Henrique no QUADRO I?

   Com o casamento e a concessão do Condado Portucalense, D. Henrique ficou ligado à família real e pelos habituais laços de vassalagem que sempre respeitou, pelo menos, até à morte de Afonso VI, ocorrida em fins de abril de 1109. Nessa qualidade, confirmou diplomas imperiais, o que prova que era chamado à Cúria de Afonso VI e nela participava. Ajudou-o em campanhas militares e ia com fequência à corte do imperador. Comportava-se, em suma, como um autêntico senhor feudal.
   As confirmações ocorriam, em regra, quando se tratava de atos destinados a dispor de bens (v.g doações, vendas...) e que, segundo o direito da época e de acordo com a interpretação mais verosímil, eram os parentes dos outorgantes que davam a aprovação ao ato que atingia o património da família.
     A ausência de D. Teresa na maioria das confirmações, atribuidos ao conde D. Henrique, leva necessariamente à conclusão de que estaria longe do marido, ou seja, na sua residência condal de Guimarães. Como a administração do Condado estava entregue ao marido, competia a D. Henrique deslocar-se para confirmação dos documentos. Diferente era nos casos em que intervinham como outorgantes. Aqui já era necessária a intervenção de ambos os cônjuges, ou de um deles com autorização ou consentimento do outro. Os documentos constantes do QUADRO II são reveladores dessa governação, a partir de Guimarães, que, na altura, além de centro geográfico do Condado, como vimos, era também um importante centro político e religioso e dotado da necessária chancelaria.

Como estamos a falar de intervenientes nos documentos medievais, esclareça-se, para melhor compreensão dos leitores, que, para além dos outorgantes e confirmantes, intervinham também nos documentos, testemunhas (ts) e, por vezes, os visores (quos vidit), que garantiam a publicidade do ato. A autenticação ou validação dos diplomas régios fazia-se pelos sinais régios (vg. uma cruz), pela robora régia (por ex., Ego comes henricus e ego famula Tarasia hanc kartam donationis et firmitatis manum ro+boramus). Como os mosteiros tinham geralmente o seu scrptorium, quando se tratava de ato que os beneficiasse, por vezes, elaboravam eles próprios os diplomas levando-os depois à robora régia.
   Nos documentos do QUADRO II e nos restantes que fazem parte dos Documentos Medievais Portugueses (DMP), D. Henrique e D. Teresa atuam como outorgantes e validam os documentos com a robora régia, o que significa tratar-se de atos de soberania, ao contrario das confirmações do QUADRO I que são meros atos de administração, garantindo o controlo dos bens familiares.  

O que diz a historiografia e a diplomática?

 O diplomatista, Rui Pinto de Azevedo, explica a diferença entre o menor número de documentos do espólio diplomático de D. Henrique (1095-1112) e o maior número de D. Teresa (1112-1128), posterior à morte do marido, nos seguintes termos:
  “para o Conde há uma razão especial a justificar o menor número de fontes nos arquivos portugueses:a sua esfera de ação, a longa permanência e senhorio de terras fora dos limites do Condado Portugalense, sobretudo após a morte do imperador Afonso VI. Para D. Teresa essa razão não conta - e por isso, também, o seu espólio é mais rico - pois os seus poderes soberanos se circunscreveram, por assim dizer, à Terra Portugalense” (cf. opus cit. XX). 
   Por sua vez, A. Herculano afirma que as campanhas militares e as obrigações de vassalagem levaram o Conde a ausentar-se frequentemente do governo da Terra Portucalense e fizeram que sua mulher “suprisse por autoridade própria ou por consentimento dele, a falta do marido” (cf. Hist. de Port. - II, nota VII, 243 -7ª ed.).
   Por outro lado, também a qualidade de mulher e de mãe impedia que D. Teresa acompanhasse o marido a essas expedições guerreiras ou nas viagens longínquas, sendo muito possível que o fizesse nas pequenas excursões pacíficas pelo Condado.
    E o Prof. José Mattoso diz que o ano de “1096 foi aquele em que o Condado Portucalense surgiu como entidade política” e que a sua fundação, além do mais, “destinava-se a criar uma instância de comando militar capaz de fazer frente às investidas almorávidas”. Afirma também que “o poder central do Condado, não tendo caráter monárquico, organiza-se à semelhança do rei, constituindo os seus orgãos segundo o modelo que este lhe fornece” (cf. Identidade de um País - pags. 47 e 57). Em outro estudo, ao falar dos nobres nas cidades portuguesas na Idade Média e do monacado beneditino, José Mattoso defende que “Guimarães era o centro dos antigos condes de Portucale, desde o sec. IX ou X, e foi também a cidade preferida pelo novo conde de origem borgonhesa, Henrique e sua mulher Teresa. Acrescentando ainda que “D. Henrique e D. Teresa actuam como os príncipes territoriais dos países do Norte, isto é, criam a sua própria corte e procuram imitar os reis em tudo” (Portugal Medieval - Novas interpretações -203, 275).
    Segundo Alberto Sampaio, “a parte alta da cidade recebeu a denominação de Villa em razão de aí se encontrar, fora do castelo propriamente dito, o palácio real onde fixaram residência D. Henrique e D. Tereza (cf. As “Villas” do Norte de Portugal).
   É dentro deste circunstancionalismo que se deve interpretar as confirmações e outorgas, ou seja, quando era necessário intervir como confirmantes em documentos respeitantes a atos fora do Condado, como regra, essa intervenção era efetuada apenas pelo marido. Nos casos mais solenes, nas outorgas, e em outros atos documentais em que o direito da época assim o exegia, então D. Teresa assegurava também ela a sua intervenção nesses documentos. A recolha da rebora do documento poderia ser efetuada na própria residência de D. Teresa, salvo nos documentos solenes em que era prestado juramento super altare”, pois, neste caso, exigia-se a sua presença física no local da respetiva igreja, onde a outorga se realizava, como aconteceu com a doação do mosteiro de Lorvão à Sé de Coimbra (doc. 15). 
Segundo Rui Pinto de Azevedo, “os serviços do governo de D. Teresa tiveram uma organização muito semelhante à das chancelarias régias medievais, na sua fase inicial. Deste modo, ao fundar-se a nacionalidade não houve que improvisar ou importar diretamente de cortes estrangeiras praxes e usanças para o estabelecimento dos referidos serviços”. Para este autor “tudo leva a crer que a instituição do scriptorium ou chancelaria condal remonte aos primeiros anos da chefia de D. Henrique em que já haviam sido criadas as mais altas magistraturas da sua casa, o maiordomus e o armiger, em que alguns magnates da Terra Portucalense, sujeitos à autoridade dele, dispunha de notários privativos (cf. Rui Pinto Azevedo- op. cit.).
Como referimos acima, durante o governo do Conde D. Henrique (1095-1112, o notário da cúria era o cónego da igreja vimaranense, Pedro Moniz, que assina com o nome de Pedro Bispo (vg. Petrus Vimaranensi clerici comit notuit ou Petrus Episcopus comiti notarius eclesie vimaranensi canonicus notuit (DMP: 17, 20, 21, 24 e 39). D. Teresa, ao tomar a direção da província Portucalense, após a morte do marido (1112-1128), designou para notário da sua cúria o subdiácono bracarense Menendus (Menendus Bracarensis subdiaconus ipsius infantis notator qui scripsit (DMP:. 36, 45, 48, 49, 50, 53-56, 58, 59, 65, 67, 70, 71, 75 e 79).
   Acrescente-se, em complemento do que já foi dito sobre a matéria, que muitos diplomas de D. Henrique e D. Teresa foram lavrados por notários e escribas estranhos à cúria condal (aula comitis), mas ligados às catedrais e mosteiros e a alguns magnates como é o caso do scriptorium privado do magnate Soeiro Mendes, confiado a Ordonho que lavrou a doação do mosteiro de Sto Tirso, em 23 de março de 1098, de terras que D. Henrique lhe coutara. Os documentos 30 e 43 foram lavrados pelo notário Honorico Viliamondes, presbitero da Sé de Braga.
  Como se constata, até a localização da chancelaria da cúria condal e respetivos notários e serviços apontam para a sede do Condado em Guimarães.
   Admite-se como possível, segundo alguns estudiosos, que muitos diplomas concedidos a entidades singulares tenham desaparecido. A explicação reside na transitoriedade dos títulos de propriedade dos pessoas particulares, em contraste com a perpetuidade dos documentos relacionados com entidades coletivas, vg, sés e mosteiros. Rui Pinto de Azevedo, ao estudar os documentos perdidos dos condes Portugalenses, regista 5 para D. Henrique e 23 de D. Teresa, admitindo existirem muitos mais. Aliás, foi o que se passou com a destruição de muitos cartórios medievais, ao longo dos tempos, nessas classes de documentos.

     De todo o exposto, é possível concluir, com suficiente probabilidade, o seguinte:

   1 - Para encontrar o local de nascimento de D. Afonso Henriques, na falta de certidão de nascimento ou documento equivalente, temos de nos socorrer de prova indireta. Enquanto a prova direta demonstra, de forma imediata, que um determinado facto ocorreu, a prova indireta assenta em dados circunstanciais que, quando conjugados, podem levar à convicção da ocorrência do facto que se investiga.
   2 - Assim, não é verosímil pensar que, após a concessão da Terra Portucalense, o casal Henrique e Teresa governasse o Condado a partir de Leão e Castela. A exigência da governação e os meios de transportes da época impunham a presença fisica no Condado.
 3 - Após a concessão do Condado, em 1095, Guimarães era o local mais adequado, geográfica e administrativamente, para a instalação da sede do Condado, sendo que o primeiro ato oficial que Henrique e Teresa tomaram foi conceder o Foral a Guimarães, em 1095 ou 1096. Alguém acredita que se D. Teresa residisse em Viseu, em 1109, como defende Almeida Fernandes, apenas 27 ou 28 anos depois lhe concedesse foral, em maio de 1123?
  4 - A ameaça moura nas zonas de Lamego, Viseu, Seia e Coimbra aconselhava a  
 manutenção da residência Condal em Guimarães.
  5 - Sabe-se que alguns franceses que acompanharam D. Henrique estabeleceram-se na Villa Vimaranes e aqui construiram a capela, em terreno doado por D. Henrique e situado junto do “nosso paço real” (palatium nostrum regale) e de quem diz: “escolhestes habitar connosco” (elegistis nosbiscum commorari”). A conjugação das duas referências apontam para a residência oficial dos Condes em Guimarães.   
   6 - Até Almeida Fernandes - que construiu uma tese a favor de Viseu - admite ter D. Teresa residido em Guimarães (no paço de Guimarães), nos primeiros anos de posse e governo da sua Terra de Portugal (cf. Viseu, Agosto de 1109, Nasce D. Afonso Henriques, pag. 19).
   7 - A doação de 30 de janeiro de 1105, ao mosteiro de Santo Isidoro de las Dueñas, de herdades situadas no Condado e a intervenção de 26 personalidades, residentes no Condado, levadas por Henrique e Teresa, além de apontar para a residência condal em guimarães, teve por finalidade obter apoio de Cluny no fortalecimento do poder dos Condes no território Portucalense. Saliente-se que, dos documentos elencados por Abel Estefânio, esta doação é o único documento outorgado por D. Teresa, no Reino de Leão e Castela, facto que torna desde logo inviável o itinerário invocado pelo ilustre investigador.
   8 - Tudo leva a concluir que, após a concessão da Terra Portucalense, D. Teresa residiu no palácio real de Guimarães até cerca de 1121, altura em que se associou a Fernão Peres de Trava e terá passado a residir em Viseu, recebendo aí apoios significativos à sua política dissidente do filho e da nobreza do Condado. E foi daí que os seus apoiantes partiram para o confronto na Batalha de S. Mamede.
   9 - Os factos antecedentes da Batalha de S. Mamede (24.06.1128) e os mais importantes documentos da época assim o sugerem, nomeadamentea a doação de Seia e do castelo de Santa Eulália (c. Montemor-o-Velho) ao conde galego, respetivamente, em maio de 1122 e 1123 (DMP. nº 62 e 63); o doc. 72, lavrado em Viseu, em outubro de 1125. Recorde-se que só após se fixar em Viseu é que D. Teresa lhe concede o foral, em maio de 1123.
  10- Admitindo-se, como mera hipótese, que o casal, nos primeiros 5/6 anos, após a concessão da Terra Portucalense, continuou a residir no reino de Leão e Castela, tal período abrangeria apenas o nascimento das 3 filhas (Urraca, Sancha, Teresa). Quando muito abrangeria também o irmão mais velho de D. Afonso Henriques, como se deduz da referência a filhas e filhos” constante do texto da doação do mosteiro de Lorbão à Sé de Coimbra (doc. 15).
  11- O governo do Condado e os transportes rudimentatares da época, exigiam, naturalmente, residências ocasionais em Coimbra e Viseu.
  12 - Conjugando o texto da Vita Sancti Geraldi com o da Vita Sancti Theotonii é possível concluir o seguinte:
   a) - Por volta de 1103, o mosteiro, fundado por Mumadona, foi convertido na Colegida (Ecclesia Vimaranensi) e era alí, segundo se deduz do episódio da expulsão de Egas Pais, narrado na Vita Sancti Geraldi, que D. Henrique e D. Teresa assistiam aos ofícios divinos. (cf.  PMH - Scriptores- vol.-  I - 53).
  b) - Uma vez que o casal assistia aos oficios religiosos nessa “Ecclesie Vimaranensi”, é lógico e muito provável que D. Afonso Henrriques aí tivesse sido batizado em 1106 por S. Geraldo, dois anos antes do seu falecimento, contrariando a tradição relativamente à igreja de S. Miguel do Castelo, construída em anos posteriores (sec. XIII), como parece resultar da sua estrutura e estilo românico tardio, com prenúncia do gótico. S. Geraldo faleceu em 5.12.1108, em Bornes, concelho de Vila Pouca de Aguiar, quando se encontrava em visita pastoral.
  c) - Segundo a tese de Abel Estefânio, obtida através de uma passagem da Vita Sancti Theotonii, D. Afonso Henriques teria nascido em 1106. Recorde-se que esta fonte´(Vida de S. Teotónio) parece mais credível que a Crónica dos Godos por esta  fonte apresentar três datas contraditórias.
  13 – Uma tradição oral e literária, especialmente a partir do secs. XV/XVI, recebida por Duarte Galvão (1445 - 1517) e expressa na Crónica de El-Rei D. Afonso Henriques, localiza o nascimento do infante Afonso Henriques, em Guimarães, nos seguintes termos:
      
        ... quando Egas Moniz soube que a Rainha parira cavalgou à pressa, e veio
               a Guimarães onde o Conde estava e pediu-lhe por mercê que lhe desse o
               filho que nascera, para o haver de criar, como lhe havia prometido ....

   14 - Esta tradição surge, pois, como uma possibilidade cuja verosimilhança se afigura poder ser aceite sem qualquer dúvida. Negar o nascimento do infante, em  Guimarães, é negar a possibidade da transmição oral das tradições e da sua veracidade, antes da consagração pela palavra escrita.
   15 - Todo este circunstancionalismo confirma essa longa e unânime tradição, firmemente arreigada, justificando o facto de a historiografia, ao longo dos tempos, nunca sentir necessidade de questionar o local de nascimento do Rei Fundador.
   16 - Penso que, através de toda esta prova indireta, terá sido encontrada a tese mais verosímil para o local de nascimento de D. Afonso Henriques, já que, nesse tempo, não havendo maternidades, os filhos nasciam onde residiam os pais, neste caso, no palácio real da Villa Vimaranes. Se tantarmos traduzir essa probabilidade em números, julgo não andar longe da verdade se fixar 80% a favor de Guimarães e 20% para outros locais propostos.

    (Para melhor esclarecimento consultar do Autor: D. AFONSO HENRIQUES - Data e Local do seu Nascimento).